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CVM veta registro de empresa aberta à Azul

Por Graziella Valenti | Valor Econômico

17/10/2013

 

A decolagem da empresa aérea Azul na BM&FBovespa foi suspensa. Não só pelas condições de mercado, mas também pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A área técnica do regulador negou o registro de companhia aberta à criação de David Neeleman.

A companhia não quis comentar o assunto, mas informou que vai recorrer dessa decisão.

O recurso é encaminhado ao mesmo departamento que fez o veto, a Superintendência de Relações com Empresas (SEP). Caso haja nova negativa, a discussão vai automaticamente ao órgão máximo da CVM, o colegiado - os quatro diretores mais o presidente.

O motivo da negativa são os "super direitos"- e inovadores - atribuídos pela Azul às ações preferenciais. Na estrutura feita pela companhia, cada ação preferencial tem direito a um dividendo equivalente ao de 75 ações ordinárias. A proporção vale também para "tag along" (prêmio em caso de venda do controle) e até em caso de liquidação da empresa.

Esta é a estrutura atual da Azul e aceita pelos sócios financeiros - os fundos TPG Growth, Weston Presidio e o Gávea, fundado pelo ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, além dos grupos Bozano e Águia Branca.

A companhia pretendia levantar R$ 1 bilhão com uma oferta inicial de ações (IPO) na bolsa. Mas já assumiu que os planos estão adiados para o começo de 2014.

A área técnica da CVM viu no modelo da Azul um descumprimento da Lei das Sociedades por Ações, que limita o capital preferencial de uma companhia a, no máximo, 50%. O raciocínio do regulador é que os benefícios das preferenciais da Azul desequilibram a proporção com os direitos políticos previstos na lei.

Na visão da CVM, conforme o Valor apurou, o percentual tratado na lei não visa só a divisão do capital e dos dividendos, refere-se também ao volume de recursos investidos numa empresa.

Na prática, a inusitada estrutura usada pela Azul traria para o Brasil o conceito do "super voto" existente fora do Brasil, em mercados desenvolvidos. Só que ao contrário.

A legislação brasileira não permite que uma ação tenha direito a mais do que um voto. Mas não limita os benefícios econômicos.

Esse é o ponto mais crítico da decisão da CVM. O caminho escolhido pela autarquia, na visão de especialistas do direito societário, foi de fazer "política pública".

Apesar de alguns especialistas verem espaço para a recusa, predomina a visão de que o tema precisa, no mínimo, de um debate mais aprofundado. Trata-se de uma decisão estratégica para o país.

A expectativa é que a Azul, caso não consiga o aval da CVM abra capital fora do Brasil. Nos Estados Unidos, várias companhias usam o 'super voto': Ford, Berkshire (de Warren Buffett) e Google.

A opção da Azul pelas "super preferenciais" tem relação direta com questões regulatórias.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) determina que o fundador David Neeleman (brasileiro) precisa garantir o controle - 80% do capital votante.

O desafio deve-se ao fato de o setor de aviação ser altamente intensivo em capital. Daí a quase impossibilidade de se criar uma nova empresa sozinho.

Neeleman possui 67% das ações ordinárias e 4,9% das preferenciais. As famílias que antes controlavam a Trip - adquirida pela Azul - têm o restante das ordinárias: os Chieppe detêm 17,8% do capital votante e 14,3% do preferencial. Já os Caprioli ficaram com 15,2% das ordinárias e 12,2% das preferenciais.

A despeito de ter o controle político da Azul, o fundador tem só 9,2% de seu valor econômico. Caso a companhia vá ao limite legal de preferenciais, de 50% dos papéis, Neeleman, Chieppe e Caprioli poderiam ficar com uma exposição de só 1,3% do negócio, mantendo 80% das ordinárias.

A teoria econômica aponta que há mais alinhamento entre controlador e mercado quanto mais próximo estiverem a exposição econômica e os diretos políticos.

Porém, tampouco a legislação brasileira prevê tal casamento, tampouco a estrutura da Azul é a única forma de separação dos poderes políticos dos econômicos.

A legislação brasileira segue a lógica de compensação da preferencial, pela falta do poder de voto, com dividendo superior. A lei dá três opções de vantagens econômicas e quando trata do dividendo maior exige "pelo menos, 10% a mais". Mas não impõe teto.

Na prática, ao recusar o modelo da Azul, a CVM limita o valor da preferencial e seus benefícios. Além disso, impede que o investidor se manifeste sobre esse modelo, em que a alavancagem é clara e regulada no estatuto.

No Brasil, outras formas de alavancagem de controle são possíveis. A estrutura de holdings em cascata é a mais comum. Está presente nos mais diversos setores. Da polêmica Oi, onde um grupo com pelo menos sete participantes divide 19% do valor econômico da operadora, até o elogiado grupo Itaú, controlado pela holding Itaúsa. (Colaborou João José Oliveira)

 


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