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Em caso de corrupção, estatal veste seus dois chapéus

12/11/2014 às 05h00

Valor Econômico - por Fernando Torres | De São Paulo

A investigação aberta pela Securities and Exchange Commission (SEC) e pelo Departamento de Justiça (DoJ) para investigar casos de corrupção na Petrobras é apenas mais um problema na série de dores de cabeça que a vida dupla da companhia lhe rende. Ora a Petrobras é uma empresa "privada", ora ela é uma estatal.

Para efeito da aplicação da legislação americana de combate a corrupção no exterior, conhecida pela sigla FCPA, a Petrobras veste os dois chapéus.

Quando empreiteiras dão "algo de valor" a executivos da petrolífera, como admitiu o ex-diretor Paulo Roberto Costa, em troca da obtenção de contratos com a companhia, a Petrobras é considerada uma estatal pela SEC e pelo DoJ. Seus executivos são equiparados a agentes do governo recebendo propina e está configurado o caso clássico de corrupção: uma empresa privada paga suborno a um agente público para obter vantagem comercial.

É possível dizer que as empreiteiras que estiverem sujeitas à FCPA, por terem emitido títulos de dívida nos Estados Unidos ou operações naquele país, serão investigadas com base nessas acusações. E provavelmente não haverá muito espaço para escapar. Multas pesadas virão e há chance de executivos serem processados criminalmente.

Se a investigação acabar por aí, a Petrobras será apenas vítima.

A FCPA não prevê expressamente punição para corrupção passiva. Não é uma lei com espírito moralizante por si só, mas sobretudo um instituto contra a competição desleal. Ela procura impedir que uma empresa que aceita pagar propina para autoridades no exterior, uma corruptora ativa, tenha vantagens sobre as outras que rejeitam essa prática.

É aí que entra o outro chapéu da Petrobras, de empresa de economia mista, parcialmente privada.

Pelo que consta dos depoimentos, a Petrobras superfaturava contratos com empreiteiras em 3%, que posteriormente dividiam essa "comissão" entre executivos corruptos da petrolífera, intermediários como o doleiro Alberto Yousseff e com partidos políticos da base aliada do governo.

O fato de os "cheques" para os partidos políticos serem assinados por gente de fora da estatal não isenta a companhia de responsabilidade, já que a FCPA inclui a ação de terceiros. Nessa parte do caso, trata-se da Petrobras, como uma empresa qualquer, dando "algo de valor" a um agente público, que é o partido político (equiparado pela FCPA a um membro do governo), com o uso de uma empreiteira como intermediária.

Mas falta uma peça nesse quebra-cabeça, que é descobrir qual o intuito da Petrobras ao fazer esse pagamento. As empreiteiras pagavam os executivos para se beneficiar com vitórias em concorrências, aumentando a venda de serviços e seus lucros. Mas a Petrobras alimentava o caixa dos partidos para ter o quê em troca? Que vantagem ela teve sobre concorrentes que não pagaram a propina? Seu lucro ou valor de mercado aumentaram por causa desses pagamentos? Até agora isso não parece evidente.

Numa visão abrangente, alguém poderia dizer que o governo editou medidas nos últimos anos que "beneficiaram" a Petrobras, ao lhe assegurar fatia mínima de 30% nos campos do pré-sal que serão explorados sob o regime de partilha, ou ao lhe conceder blocos na cessão onerosa sem licitação (muitos dirão que esses foram presentes de grego).

Mas, ainda assim, como criar o nexo entre o repasse para os partidos e essas decisões do governo? Para punir alguém por corrupção no âmbito da FCPA é preciso mais do que conjecturas, é preciso haver provas. Advogados consideram que essa será uma parte difícil do processo.

Resta então um capítulo da FCPA que trata de contabilidade. Ao supor que o pagamento de propina terá que passar de alguma forma pelos livros contábeis das empresas, a norma prevê punição pelo registro incorreto de transações para encobrir essa saída de caixa. Neste caso, a empresa sofre processo apenas civil, com a ação criminal atingindo somente os indivíduos que tiverem ativamente adulterado o sistema de controles internos.

 

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